Ele passou por mais um cartaz que anunciava a comemoração do Dia das Bruxas da cidade e revirou os olhos em sinal de descrença. Faziam apenas alguns dias que o rapaz estava naquele lugar esquecido pelo resto do mundo e já estava louco para ir embora. Todos ali se mostravam muito supersticiosos e cheios de histórias a respeito de casas mal assombradas e almas que ainda permaneciam neste mundo que Allan se perguntava se eles mesmos eram de outro planeta.

Seu pai o havia mandado em uma missão para reaver uma antiga propriedade da família, mas aquilo estava se provando mais difícil do que ele havia imaginado. Parecia que aquela cidade havia parado no tempo, tanto em costumes quanto na burocracia.
Bem que sua mãe o havia alertado para se cuidar e ficar sempre atento a qualquer coisa estranha que acontecesse, enquanto o pai simplesmente bufava e a repreendia por ser preocupada demais com o filho mais velho.
Ele caminhou pela Rua 7, quase deserta, no bairro central da cidade, chutando pequenas pedras ocasionalmente no caminho. Até que um brilho estranho no chão chamou sua atenção. Ele então se curvou e estendeu a mão para o objeto, descobrindo que, na verdade se tratava de um pequeno espelho ornamentado com rosas feitas de ferro.
Parecia um objeto antigo e talvez até valioso, então ele o enfiou no bolso para uma inspeção mais detalhada quando chegasse à pensão na qual estava hospedado. Mas assim que ergueu o corpo novamente se sobressaltou com um vulto em sua visão periférica.
Descobriu que estava parado bem em frente ao casarão da família Mendez. O lugar estava claramente abandonado fazia muito tempo, as janelas de madeira pendiam das paredes, balançando com o vento. Além disso, o jardim da frente estava em ruínas, as plantas cresciam irregularmente pelo terreno, quase cobrindo completamente a frente da casa, as paredes estavam sujas e com tinta descascando, os enormes portões de ferro estavam firmemente enrolados por correntes para afastar crianças curiosas, embora a aparência do lugar já o fizesse.
Não entendia porque raios o pai insistira tanto em reaver aquele casarão em ruínas, ao invés de simplesmente tentar vendê-lo a qualquer pobre coitado que fosse burro o bastante para adquiri-lo. O rapaz apertou mais os olhos para ver direito o enorme casarão, pois já era crepúsculo e o sol se punha com rapidez no inverno. Ele apertou mais o casaco em torno de si e recomeçou sua caminhada, deixando a casa triste e solitária para trás, sem nem ao menos perceber o olhar que o seguia.
Na manhã seguinte Allan acordou sobressaltado, com um desconforto estranho no peito. Como um sentimento de que algo está errado, porém sem saber dizer o que exatamente. “Provavelmente” pensou ele “é só a estadia nesta cidade horripilante.” Se levantou da cama e esfregou o rosto com uma das mãos, sentindo o aperto no peito aumentar e os ossos tremerem ligeiramente. Ele estava inquieto, com a sensação de que precisava estar em algum lugar ou encontrar alguém.
Foi então que reparou no pequeno espelho em cima da mesa de cabeceira, refletindo a fraca luz do sol que entrava pela janela. Pegou-o na mão e o analisou novamente, passando os dedos pelo ferro retorcido em toda a sua borda, onde haviam três lindas rosas fundidas à moldura…
Do lado de fora do quarto a dona da pensão passava pelo corredor enfiando algumas correspondências de hóspedes pela fenda que havia em cada porta. Quando chegou no quarto do rapaz, ouviu um som estranho, como se algo pesado tivesse caído no chão. Então uma luz pálida brilhou por debaixo da porta e entre o vão da correspondência.
Ela buscou com as mãos trêmulas o molho de chaves que sempre carregava consigo e em seguida selecionou a chave com o número do quarto do rapaz. Enfiou-a na fechadura e girou-a com agilidade. Porém, quando finalmente entrou no quarto tudo o que encontrou foi um pequeno espelho ornamentado com quatro rosas de ferro fundidas ao redor da moldura, caído no chão.

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