Mário de Andrade é considerado um dos grandes ícones literários brasileiros que fez parte da Semana de Arte Moderna de 1922, marco do Modernismo Brasileiro. Este evento – destinado a divulgar a arte “genuinamente brasileira” – foi organizado por intelectuais e artistas cujas obras são estudadas até hoje, quase cem anos depois, por suas inovações estéticas e por terem se tornado referências culturais no Brasil.
Nesse sentido, não poderíamos falar de literatura modernista brasileira sem falar de Mario de Andrade. Poeta, romancista, crítico literário, folclorista, músico e ensaísta, Andrade possui uma trajetória artística e literária surpreendente. É um dos nomes mais influentes da literatura brasileira.
Difícil citar qual é a obra mais importante deste escritor. Acredito que normalmente vinculamos o seu nome ao romance Macunaíma, no entanto, a riqueza de sua obra poética não pode deixar de ser mencionada já que é justamente em um dos seus livros de poesia que encontramos aquele que é dito como o manifesto modernista: o Prefácio Interessantíssimo.

Leitor:
Está fundado o Desvairismo.
Este prefácio, apesar de interessante, inútil. […] (página 35)

De Pauliceia Desvairada a Lira Paulistana é o lançamento da Martin Claret que mostra a trajetória poética do escritor Mario de Andrade. São várias obras em verso, publicadas entre 1922 e 1945. Unidas em um único volume, o leitor pode perceber as diversas facetas e o caminho percorrido pelo autor na literatura modernista brasileira. Em Pauliceia Desvairada, a primeira obra deste livro, encontramos uma poesia combativa, comprometida com a renovação da identidade nacional. Pode-se dizer que o poeta está bastante contagiado pelo movimento modernista e a arte vanguardista.

Minhas reivindicações? Liberdade. Uso dela;
Não abuso. […] Não pretendo obrigar ninguém a seguir-me.
Costumo andar sozinho.
(página 44 em Pauliceia Desvairada)

Losango Cáqui, Clã do Jabuti e Remate de males também estão presentes neste volume e fazem parte, junto a Pauliceia Desvairada, ao que poderíamos chamar de uma primeira fase da poesia marioandradina. Todas essas obras foram publicadas na década de 1930 e trazem experimentos poéticos em verso livre e São Paulo como um “personagem importante”, símbolo da modernidade e palco de desenvolvimento urbano e cultural.

Já estou livre da dor…
Mas todo vibro da alegria de viver.
Eis por que minha alma inda é impura.
(página 130 em Losango Cáqui)

A fase mais madura de Mario de Andrade também está presente em De Pauliceia Desvairada a Lira Paulistana. Os poemas de Lira Paulistana e O Carro da Miséria foram escritos durante o Estado Novo e, nesta época, o poeta compunha uma poesia extremamente política, denunciando a miséria, a exploração e outras injustiças sociais.

Vou-me embora paz da terra
Paz da terra repartida
Uns têm terra muita terra
Outros nem pra uma dormida
(página 288 em O carro da miséria)

Apesar de identificarmos essas fases poéticas do autor, não há aqui uma divisão temática necessariamente. Explico melhor: Mario de Andrade possui um projeto literário bastante consistente e não há uma ruptura em sua obra, ou seja, seus versos sugerem uma série de temas muito prezados, muito importantes para o poeta e perpassam por todas suas obras, em menor ou maior escala. Mas estão ali, emergindo e revelando-se a cada página.

I
Meu coração estrala.
Esse lugar-comum inesperado: Amor.
(página 101 em Losango cáqui)

O leitor se vê diante de um primoroso exemplar da produção de Mario de Andrade. O escritor explora assuntos tão essenciais ao ser humano que, apesar de muitos não gostarem do gênero poético – ou o considerarem de difícil compreensão –, é impossível não se identificar com os versos. A poesia marioandradina fala da vida e da morte, da relação entre música e poesia, do espaço (no caso, a cidade de São Paulo), do tempo, da mudança e, até, de reflexões amorosas. Recomendo e muito a leitura de De Pauliceia Desvairada a Lira Paulistana. Viaje pela paisagem paulistana, escute a melodia dos versos de Mario de Andrade. Leia! Você encontrará o que há de melhor de um dos grandes poetas modernistas brasileiro.

Eu nem sei se vale a pena
Cantar São Paulo na lida,
Só gente muito iludida
Limpa o gosto e assopra a avena,
Esta angústia não serena,
Muita fome pouco pão,
Eu só vejo na função
Miséria, dolo, ferida,
Isso é vida?
(página 422 em Lira paulistana)

  • De Pauliceia Desvairada a Lira Paulistana
  • Autor: Mário de Andrade
  • Tradução: -
  • Ano: 2017
  • Editora: Martin Claret
  • Páginas: 470
  • Amazon

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