Meu ano começou com ótimas leituras, mas uma especificamente me deixou abismado com toda sua qualidade. As próximas que eu fizer terão que ser muito surpreendentes para tirar desse livro o título de melhor do ano. Deixada Para Trás é simplesmente tudo que se quer em um livro, ele tem suspense, horror, terror psicológico, tem uma edição linda, personagens marcantes e carismáticos, um final inimaginável, completamente plausível e coerente. 

Charlie Donlea nos apresenta Megan, uma garota que fora sequestrada, mas que conseguiu se livrar das garras do seu carcereiro e que encontrou na estrada um caminhoneiro que lhe ajudou a voltar para os braços da sua família. A outra personagem principal é Lívia, uma estudante de patologia forense, que teve uma irmã também sequestrada, colega de Megan, mas não teve a mesma sorte que ela, e, até hoje, está desaparecida.
Megan acaba de lançar um livro onde conta sua história, sua força e como ela precisou se superar para conseguir fugir em um momento tão desfavorável, porém tudo que ela relata em seu livro não é o que ela sente dentro de si, é apenas o que a sociedade, seu psicólogo, seu editor e sua família desejam que ela seja. Na realidade, Megan sente um vazio interno, se perguntando, um ano  depois de se salvar, quem ela realmente é e como poderia ajudar outras meninas como Nicole que não conseguiram ter a própria história de redenção.

Lívia, em contrapartida, desejou seguir essa carreira para ela mesmo fazer a autopsia da irmã, pois já não tem esperanças de encontrá-la com vida. Ela busca se especializar para através do corpo da irmã, achar quem a tirou da família. É em uma autopsia de rotina que Lívia encontra algo estranho, através do corpo de um rapaz, que teoricamente teria se suicidado pulando de uma ponte, ela descobre que ele, na realidade, apresenta sinais de violência e descarta imediatamente a morte por afogamento e o suicídio. Dias depois, ela descobre que o garoto encontrado era o namorado misterioso da irmã, que ninguém conhecia pessoalmente, nem mesmo as amigas mais próximas.
Deixada Para Trás é dividido em seis partes, a primeira começa logo um ano depois de Megan ter se salvado e com a inserção de Lívia a história. Antes disso, na introdução do livro, você lê rápidos capítulos que mostram algumas cenas do momento em que Nicole some e do sequestro de Megan, mas nada que revele a história por completo, apenas passando o tom pesado do psicológico da situação. Cada uma dessas partes traz uma revelação surpreendente e que impressiona na sua qualidade e intensidade, deixando marcada cada uma das descobertas reveladoras feitas pela dupla, que acaba se unindo para tentar descobrir quem está fazendo esse horror com mulheres e onde está o corpo de Nicole, ou, se por alguma sorte do destino, ela ainda estaria viva, encarcerada em algum lugar.
A trama do livro é cem por cento crível, bem embasada, assim como a maneira que as descobertas são feitas que também são magníficas, sem serem forçadas ou mirabolantes. As personagens principais têm um carisma significativo, você se envolve com elas, começa a torcer e a sofrer junto com o que vai acontecendo. A resolução do drama é construída no momento certo, sem apressar as coisas ou deixar enroladas demais, ela simplesmente acontece, e o final do livro tem requintes de crueldade com o leitor, acho quase impossível não emocionar quem lê.

A edição da Faro Editorial é igualmente perfeita, com páginas grossas, daquelas que quando você a vira sente aquela satisfação, de tão bom que é tê-la entre os dedos. O livro tem diversos flashbacks, mostrando o dia a dia de Lívia antes de ser sequestrada, nessas páginas, a cor amarelada normal dá lugar a um acinzentado digno de calafrios. Cada começo de capítulo inicia alertando o leitor onde ele acontece, em qual ano, e o que aquela data representa para a personagem principal do trecho. Um livro completo, perfeito, desde a sua capa até o seu final, não há uma queixa, um ponto a ser considerado, a tradução inclusive não deixa nada a desejar, o nome do livro em inglês é “The Girl Who Was Taken”, algo como “A Garota Que Foi Pega”, e eu, que sempre sou crítico ferrenho de traduções, achei o nome em português muitíssimo melhor e com muito mais sentido.

Charlie Donlea é americano de Chicago, seu primeiro livro foi A Garota do Lago e que no começo do ano passado fez muito sucesso por aqui.  Eugostei muito deste primeiro livro, mas Deixada Para Trás é uma obra prima, é o melhor livro que li em muito tempo, no quesito suspense é difícil dizer outro nome recente que seja superior a ele. Estou entusiasmado demais com esse novo escritor, o crescimento dele entre um livro e outro é excepcional. A velocidade com a qual a Faro tem trazido seus livros para o Brasil é igualmente maravilhosa e eu só posso querer mais e mais.

O autor fez um ótimo livro de lançamento e um livro perfeito na sua segunda obra, virou um dos meus escritores favoritos, daqueles que você olha o livro na estante de lançamentos e nem precisa ler a sinopse pra saber se vai levar para casa ou não, leva apenas pelo nome do autor. É impossível não ficar com aquele sentimento de “se ele chegou tão longe já no segundo livro, será que o terceiro decepcionaria?” deve ser por isso que ele ainda não tem uma nova obra engatilhada, parece escrever seus livros com calma, sem a pressão de uma editora querendo mais obras e o apressando para livros que trarão dinheiro pelo seu nome e não pela qualidade do que foi preparado.

Se você gostou de  A Garota do Lago, se você gosta de suspense, se você gosta de terror psicológico, se você gosta de um livro que te surpreenda, enfim, se você gosta de ler, Deixada Para Trás é um livro indispensável, logo nos primeiros dias de fevereiro chega para ser o melhor livro do ano, o mais surpreendente, daqueles que você vai querer reler em breve para sentir novamente tudo que sentiu na primeira vez que leu e revisitar suas amigas Megan, Nicole e Lívia. Deixada Para Trás não pode ser deixado de lado por ninguém que goste de boa literatura, ele é o significado de porque ler é tão bom.

  • The Girl Who Was Taken
  • Autor: Charlie Donlea
  • Tradução: Carlos Szlak
  • Ano: 2017
  • Editora: Faro Editorial
  • Páginas: 406
  • Amazon

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