Nossa relação com anti-heróis por vezes, pode ser conflituosa. Em momentos os odiamos, sentimos repulsa e raiva por suas atitudes, pelo modo que se movem, atuam e se posicionam para atingir seus objetivos. Mas a verdade é que que nem sempre esperamos um herói envolto de moralidade, às vezes, estar do lado do vilão é muito mais emocionante. Entender os caminhos que o levaram até sua posição, entrar dentro de sua cabeça e descobrir que o levou ao seu modo impiedoso, é o primeiro passo para a singularidade que é preferir um anti-herói.Quando ainda criança, Honório Jorg Ancrath presenciou a morte de sua mãe e irmão mais novo William. Impotente, foi deixado para morrer meio há um arbusto de roseira-brava e quanto mais os espinhos o imobilizavam e cravavam em sua pele, mais as cicatrizes fariam parte também da sua alma. Mas Jorg sobreviveu e  presenciou a insuficiência do pai quanto a situação, desde então ele nutri o desejo de buscar vingança. Um ano depois, o príncipe dos espinhos vê a oportunidade perfeita para ir embora para buscar poder e aliados, para enfim voltar para casa, retomar o que é seu e ter a cabeça daquele que lhe moldou da forma que é hoje.

Narrado em primeira pessoa pela perspectiva de Jorg, acompanhamos toda a jornada da criança em flashbacks, que desde ao fatídico dia da tragédia de sua família viu seu mundo mudar, até os dias atuais, quando um Jorg mais maduro e crescido relata ao leitor todas as provações e maldades que causou pelos últimos anos. Apesar da pouca idade, fator que pode causar um certo desconforto para alguns, Jorg é totalmente sem escrúpulos. O príncipe é violento, manipulador e em qualquer situação, não hesita. Talvez seja por estas características que o tornam um personagem tão contestável, dúbio e não confiável.

A fraqueza em mim queria falar sobre Will. “Você terá Gelleth. Eu lhe darei o Castelo Vermelho. Eu lhe darei a cabeça de Lorde Gelleth. Então você me entregará o pagão.” E você me chamará de filho.

Jorg utiliza de todos seus atributos, de sua inteligência, lábia, beleza, tudo. Vale qualquer coisa para passar por cima dos seus inimigos e matar é o menor dos seus delitos. Desde o início, o seu objetivo é claro, retomar seu direito como herdeiro e unificar os reinos para se tornar Imperador. E ele vai lutar por tudo isso, custe o que custar, marcando quem quer que seja que cruzar o seu caminho. Desta forma, tendo este personagem bem apresentado, podemos finalmente conhecer a trama de Prince of Thorns, o que se passa neste reino e quais os caminhos que Jorg tomará para enfim concluir seus planos.

A narrativa de Mark Lawrence é direta, existirão cenas pesadas nesta história, descritas de forma crua e impactante, um reflexo da personalidade visceral e cruel do protagonista. Se você é mais sensível para este tipo de história, onde conterá assassinatos, estupro e a inserção de diversos palavrões, talvez tenha que ir um pouco mais com calma, porém se você não se importa nem um pouco com este tipo de narração, seja bem-vindo ao purgatório de Jorg Ancrath.

Mas como posso ter gostado tanto de uma história assim? As respostas são várias e talvez só lendo este livro para conseguir entender exatamente o que quero dizer. Mas eu acho que uma dessas resposta seja justamente Jorg e a curiosidade do leitor em querer saber exatamente onde este menino insano nos levaria e quais seriam as consequências das suas atitudes. É difícil distinguir em que ponto Jorg percorre a linha da persistência ou a do capricho em relação a elas e acompanhar o desenrolar desta história o torna fascinante por isso. Por você esperar tudo, menos a pior das resoluções, o desfecho que sem dúvidas Jorg escolherá.

Este universo sombrio da fantasia cativa o leitor por apresentar ao leitor o início de uma saga cheia de sangue em uma só jornada. Prince of Thorns abre as portas para um leitor curioso, que busca encontrar nessas páginas toda a beleza de uma história trilhada em meio a muita intriga, jogo de poder e interesses. Será possível até encontrar um elemento fantástico nesta história, o que só contribui com o andamento do enredo. O universo de Lawrence é implacável em vários sentidos e sua narrativa viciante, faz com que a leitura flua numa velocidade alucinante.

Ao final de cada capitulo teremos pequenas anotações que o protagonista faz em relação cada um dos personagens secundários da história. São anotações breves, detalhes que ajudam o leitor a construir a percepção que Jorg tem das pessoas ao seu redor e o modo como ele as enxerga. Desde o primeiro capitulo já é possível juntar os pedaços de sua personalidade com estas pequenas insinuações.

O Império Destruído é um cenário que causa certas dúvidas ao leitor, porém, tendo Jorg como narrador, é difícil delimitar uma linha de tempo para esta história, porém, existem várias referências que nos fazem acreditar que aqui, apesar dos reinos e príncipes, embarcamos num contexto, não tão medieval assim. Porém, acredito que eu tenha mais detalhes deste universo abandonado pelos Construtores quando fizer a leitura dos outros livros da trilogia e até do seu spin-off, que tem como primeiro volume, A Guerra da Rainha Vermelha: Prince of Fools.

Por fim, Jorg pode ser intragável, mas a verdade é que ele será um personagem que te marcara muito ao longo de sua jornada como leitor. Mark Lawrence criou um personagem que se vê acima de tudo e todos.  Sádico, sarcástico, ruim mesmo. Este é Jorg e é este o personagem que me fisgou desde a primeira página e que me vejo completamente apegada. Mesmo dentre esta enxurrada de defeitos é possível perceber e até compreender o motivo de suas reações. Entender sua intensões, real motivação e planos é chave para que Jorg não seja assim tão detestável. Agora me resta apenas estar preparada para saber onde ele irá me levar e o que conseguirá quando finalmente, descarregar toda a sua raiva do mundo. Será que tudo vai valer a pena?

Prince of Thorns é o primeiro volume da Trilogia Espinhos, lançados originalmente em 2013, as sequências são King of Thorns e Emperor of Thorns. No finalzinho de 2017, esta história ganhou uma edição de colecionador, Omnibus é um exemplar para deixar qualquer fã babando. O volume único traz os três livros, com um corte dourado e uma capa ainda mais incrível.

  • Prince of Thorns
  • Autor: Mark Lawrence
  • Tradução: Antonio Tibau
  • Ano: 2013
  • Editora: Darkside Books
  • Páginas: 364
  • Amazon

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