Nos primeiros capítulos da Trilogia de Tearling, descobrimos um reino em ruínas, abandonado por seus governantes, desolado pela pobreza, assombrado por um acordo validado pela opressão que somente um império poderoso e cruel seria capaz de implantar. Em meio a falta de esperança, observamos o surgimento de uma princesa perdida.
Acompanhando a guerra que se espalha, o inimigo que se aproxima e as consequências de boas intenções tomadas sem qualquer reflexão acerca das consequências, encontramos a princesa perdida, hoje Rainha de Tearling, refém do temível império de Mostmesne.
Todas as escolhas, ações impensadas, conselhos não ouvidos, contextos ignorados, assombram Kelsea Glynn. Trancafiada nos calabouços do castelo da Rainha Vermelha, a pobre garota deseja retomar o poder que somente a magia é capaz de oferecer. Agora ela busca forças para sobreviver enquanto em sua mente traça planos para salvar o futuro de seu reino e, embora ainda não tenha conhecimento,  prepara-se para enfrentar uma força maligna que, assim como a grande parte dos acontecimentos desta história, se viu liberta graças a mais uma de suas ações impensadas.

… e pelo resto da vida Katie jamais esqueceria aquele momento: o homem alto sorrindo para ela, a colina e o rio ao fundo, o sol vermelho-sangue ainda no céu.

Na medida em que Kelsea descobre os segredos e fantasmas que assombram a Rainha de Vermelha, acompanha o surgimento de uma revolta fora dos muros do palácio e descobre detalhes acerca de suas preciosas safiras, Clava e o restante da Guarda da Rainha se preparam para uma missão de resgate. Porém, enquanto suas mentes focam na segurança da rainha perdida, a guarda move a última peça do tabuleiro, estabelecendo de uma vez os caminhos que culminarão no destino de Tearling.

Neste contexto de guerra, segredos serão revelados e detalhes do passado e nascimento deste reino serão apresentados à única personagem que, com toda a sua incompetência para governar, pode salvar, não mais seu povo, mas toda a história e legado de Tearling.

Ao contrário do que esperava ao iniciar a leitura, O Destino de Tearling resolve, de uma vez por todas – e verdadeiramente acreditei, até atingir a quebra na história, a temida página 341 – todos os problemas mencionados quando da resenha dos livros anteriores, solucionando, ainda, elementos que nem me dei ao trabalho de destacar, pois a decepção era grande.
Aqui encontramos uma narrativa belamente estruturada que sabe não precisar focar somente na trajetória de sua suposta personagem principal, ou mesmo, na construção de trajetórias que interligam eventos de um passado longínquo aos acontecimentos do presente. Com habilidade, a obra abandona toda a linearidade e previsibilidade de Kelsea Glynn, para explorar qualidades, defeitos, características, passado e presente de personagens secundários que, como destaquei ao longo das resenhas anteriores, são muito mais interessantes e bem construídos do que a própria personagem principal. Como muitos antes dela, Erika Johansen percebe a qualidade, dificuldade e prazer de uma obra cujo foco é dividido entre personagens que, embora localizados em posições geográficas diversas, estão intimamente interligados a trama apresentada, tendo as consequências de suas ações interferindo na tomada de decisão e destino de cada um dos outros personagens.
Todo o sangue, crueldade, consequências catastróficas, toda a guerra, lutas, sacrifícios, morte e realidade de um mundo imperfeito estão vivos nas páginas deste livro. Cada evento do passado interfere nas escolhas do futuro. Cada decisão pode resultar em atos de bravura, coragem, lealdade e, como se espera de uma obra impactante, morte. Em meio a um contexto de destruição, da crueldade do homem perante seus semelhantes, da magia inexplicável que surge em um novo mundo grande parte das respostas nos são dadas, porém, um único elemento continua livre de toda e qualquer lógica que um mundo imaginário deveria possuir.

Mesmo quando acerta o tom, conecta os elementos, segredos e personagens desta história, dando destaque a aprofundamento tanto para novos quanto para velhos conhecidos desta jornada, a obra peca ao buscar solucionar todos os problemas de forma fácil e mágica. Na ânsia por responder uma pergunta auto imposta, a autora deixa passar a oportunidade de criar um maravilhoso, reflexivo e misterioso final aberto. Uma vez que se permite tomar a mais simples das decisões, solucionando todos os desafios apresentados tão belamente ao longo da obra com uma estratégia pobre, a autora decepciona. Aqui se opta pelo caminho mais fácil, pela simplicidade de eventos complexos e intimamente conectados, opta-se por ignorar oportunidades e, nem mesmo, explora-se devidamente o triste caminho tomado.

O final mediano estabelecido no ato final, quando comparado a grandeza e possibilidades de tudo o que se viu até o momento, é muito mais uma derrota para Tearling do que a vitória que busca-se vender. A simplicidade deste final dói, não por destacar o desaparecimento de personagens, mas por, uma vez mais, ressaltar os erros da autora. Não se honra o caminho escolhido, se explica porcamente o resultado daquele momento para então, com um simples piscar de olhos, apresentar o desejo, o ideal, a respostas para todas as preces que o leitor nunca proferiu.
Infelizmente perde-se o controle da obra, a conexão com o leitor, o poder de uma história que estava na direção certa. Meu amor por finais abertos enxergou a solução perfeita, e é uma pena que a autora não foi capaz de perceber, ou arriscar a estratégia que vi e desejava para este livro. Ao optar pelo caminho mais fácil, optou-se também pelas mensagens mais pobres, deixando de lado toda a profundidade que, arduamente, construiu-se ao longo destes três livros.

Confira a série A Rainha de Tearling

De maneira geral, a Trilogia de Tearling é mediana, morna, irritantemente agradável. Resolve-se tudo com soluções mágicas, fáceis, simples, as mesmas soluções que muitas vezes foram condenadas ao longo da própria obra. Talvez seus maiores críticos sejam os personagens desta história, que em muitos momentos destacaram os erros de apoiar-se em soluções mágicas.

  • The Fate of the Tearling
  • Autor: Erika Johansen
  • Tradução: Regiane Winarski
  • Ano: 2018
  • Editora: Suma
  • Páginas: 358
  • Amazon

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