Após superar um divórcio doloroso e um câncer devastador, a vida de Rachel Klein está finalmente entrando nos eixos, ou é o que ela acredita. Quando a Dra. Reed pede para vê-la em seu consultório após um simples exame de rotina, Rachel se esforça para pensar positivamente. Deixa a filha Kylie no ponto de ônibus e segue rumo a um novo veredicto sobre sua saúde. Porém ela nunca chegará a seu destino. Em meio ao trânsito caótico da interestadual ela recebe uma ligação que mudará para sempre a vida da sua pequena família.

Kylie está no ponto de ônibus esperando a condução para a escola quando é sequestrada. Ela lembra de todas aquelas notícias que viu nos jornais ao longo dos anos. Algumas meninas nunca mais voltam para casa e ela está com medo de se tornar mais uma estatística. Ela não entende por qual motivo foi sequestrada. Ela e a mãe não possuem muito dinheiro. O que ela não sabe é que os termos do resgate são completamente insanos e inacreditáveis. Não é pelo dinheiro, é pela corrente . Para que Kylie e Rachel voltem a se encontrar, a mãe da menina precisará sequestrar outra pessoa. Para que mãe e filha voltem a ter paz em suas vidas, Rachel precisará se tornar uma criminosa. Não há escapatória. A corrente está em todos os lugares, ninguém mais é confiável. Resta saber se ela terá coragem o suficiente para ser o elo forte que a organização diabólica espera que ela seja.

Você não é a primeira e nem será a última. Você está na Corrente, um processo que existe há muito tempo. Eu sequestrei a sua filha pra que o meu filho seja libertado. Ele foi sequestrado e está em poder de um homem e de uma mulher que eu não conheço. Você terá que escolher um alvo e sequestrar um ente querido dessa pessoa pra que a Corrente continue.

O livro é envolvente desde o primeiro capítulo. E como não seria? Esse é o tipo de enredo inteligente e criativo que me faz amar o gênero literário do suspense. Na verdade é fácil gostar de histórias sobre crimes hediondos quando você está na segurança da própria casa. Mas Adrian McKinty põe tudo em uma nova perspectiva quando detalha com precisão minuciosa o passo a passo de um sequestro. Ainda fico arrepiada quando penso que todas as vítimas foram encontradas e vigiadas por meio de suas redes sociais. Fico pensando no quanto de crítica à utilização excessiva e irresponsável das redes sociais, o autor quis abordar na trama. Será que estamos realmente tão seguros quanto pensamos quando fazemos da nossa vida uma vitrine exposta para quem quiser ver. A famosa ferramenta do check in muito utilizada por quem é usuários das plataformas facebook e instagram, é uma arma poderosa nas mãos de pessoas erradas.

Tal situação já foi abordada também por Joe, na série da Netflix “You”. O tema é velho, recorrente e ainda assim extremamente importante. Adrian McKinty menciona o perigo em mais de um momento. Percebi que comecei a postar o check-in apenas algum tempo depois que sai do local. O bom livro faz isso por você. Te muda em alguma coisa. E quando falamos de mudanças, podemos abordar a progressão da protagonista Rachel, que passou de uma mãe comum do subúrbio, à uma sequestradora de alto nível em algumas páginas. O estratagema do  autor foi coerente, mas faltou convicção. Uma mãe se torna uma leoa para salvar um filho, mas sequestrar o filho de outra pessoa, envolver um inocente, deveria suscitar mais questionamentos morais. Eles estavam lá, não posso ser injusta, no entanto faltou profundidade.

Ela se dá conta de que certas pessoas atualizam seus feeds no Facebook e no Instagram em intervalos de poucos minutos, e assim acabam fornecendo a possíveis sequestradores e assaltantes informações geográficas e temporais sobre seu paradeiro.

Talvez não tenha ajudado nessa questão que os capítulos sejam curtos e tudo seja abordado de forma superficial. A trama é ágil, o que torna a leitura rápida. Porém tira a força das questões mais humanas. Existem as pausas mais reflexivas onde os personagens questionam os próprios valores, mas eles não possuem a força necessária para convencer. Talvez Rachel fosse mais propensa à corrupção do que deveria. E isso tira um pouco da credibilidade do enredo, cuja proposta seja justamente a de corromper uma pessoa boa, em nome do amor. Rachel chega a falar que os organizadores da corrente se aproveitam desse sentimento para manipular as famílias, e não está de todo errada. Os capítulos narrados em terceira pessoa que abordam o ponto de vista dos demais personagens , dão um tom mais fluido ao livro e é uma ótima ferramenta quando se quer deixar a história mais encorpada. Ainda mais quando eles são tão interessantes e complexos.

A Corrente, é um livro de suspense, escrito com muito cuidado. O autor se preocupou em não deixar nenhuma ponta solta. Mesmo que o desfecho tenha soado hollywoodiano demais, irreal demais, ainda trouxe todas os devidos encerramentos. Seja ele feliz ou triste, isso você só saberá quando ler, é satisfatório, é o suficiente, e combina bem com todo o desenvolvimento. Não podemos tirar o mérito do autor de querer concluir sua obra com perfeição, mas essa mesma perfeição pode ter tirado um pouco do grande clímax da história. Eu queria algo mais surpreendente. O livro todo é uma sucessão de acertos, e não é que eu goste de ver o circo pegar fogo (ok, talvez eu goste sim), mas é que a confiabilidade de tudo acaba indo pelo ralo.

Rachel imaginava que só mesmo depois de uma vida inteira alguém pudesse ser tão mau. Mas não. E você, Rachel? Uma sequestradora, torturadora de crianças, mãe incompetente. Tudo ao mesmo tempo. E lá no fundo do seu coração você sabe que teria deixado a menina morrer. Havia a intenção, e é isso que importa na filosofia moral, na vida e perante a lei.

Adrian McKinty é um homem inteligente, há diversas citações e frases bem formuladas em seu texto. Você vira a última página e até se sente um pouco mais inteligente. No entanto, apesar de ter gostado bastante de A Corrente, senti que faltou algo. É um bom livro, mas não é ótimo. É uma leitura envolvente, mas não obrigatória. Claro que é sempre uma questão de gosto, então você ainda deveria ler para tirar as próprias conclusões. Mas tenha o cuidado de não dar muita força as suas expectativas. Depois conta pra nós o que você achou da história, sempre podemos criar um debate saudável e interessante.

  • The Chain
  • Autor: Adrian McKinty
  • Tradução: Clóvis Marques
  • Ano: 2019
  • Editora: Record
  • Páginas: 378
  • Amazon

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