Veneza, século XVIII. O Incuráveis é um antigo hospital que foi convertido em orfanato para receber as crianças que ali eram deixadas, suas regras são rígidas, meninas e meninos ficam separados, e as perspectivas de ambos também divergem, enquanto as meninas são apresentadas a música desde muito novas, e sonham em conseguir uma vaga no coro principal da igreja para que possam ter alguns “privilégios”, outras temem não possuir o talento necessário para tal, e ficarem fadadas a seguirem no orfanato desempenhando outras funções para sempre. Já os meninos ao atingir determinada idade, podem partir, conseguir um emprego e conquistar sua liberdade

Para Violetta, a vida que se desdobra no horizonte, além dos telhados e muros do Incuráveis sempre soa como uma alegria infinita, principalmente na época do carnevale, onde as pessoas usam suas máscaras, roupas que os ocultam, e todos dançam e cantam como se não houvesse diferença de um para o outro, onde todos são iguais e livres. Mas ela não é a única a desejar a vida fora dali, Mino um jovem que ela acaba por conhecer em seu telhado secreto, também nutre sonhos parecidos. Ambos compartilham a paixão pela música – ela uma soprano, ele um violonista -, e uma canção em particular toca em ambos de maneira única e emocionante, laços de amizade se estabelecem e como uma partitura que se forma, assim é o amor de ambos, que nota por nota cresce. Eles se permitem sonhar, almejar uma vida para além dos portões, desejar um futuro quase perfeito… só que o destino parece ter outras intenções, e antes mesmo que floresça, murcha.

Ela precisava de comida, de aconchego e de um abrigo tanto quanto qualquer outra criança, mas queria amor – amor de verdade, ou nada. Aquele desejo a contagiava como uma doença. E não parecia haver cura.

Em A Canção da Órfã, vamos conhecer Violetta, uma jovem sonhadora, de espirito livre e inquietante que almeja muito mais do que uma órfã ousaria desejar. A música é sua grande paixão, mas Violetta não quer apenas se tornar uma corista, ela quer mais, quer cantar além dos muros e portões, quer dançar e se envolver por toda a alegria do carnevale, dar um passeio de gôndola – quem sabe ao lado de um grande amor -, ela quer ser livre,  porém existem restrições, regras que jamais permitiriam tal feito. Por esse motivo, quando Violetta conhece Mino, tudo a sua volta ganha cor, luz e som – ainda que um segredo paire entre eles. Eles compartilham o amor pela música, o desejo de uma vida fora do Incuráveis, só que Mino busca por algo muito maior e especial, ele quer encontrar sua mãe, descobrir porque ela o abandonou e aquietar seu coração que sempre sentiu a presença dela. Com o passar dos dias e a amizade entre eles ganha força e uma nova forma, um amor puro e simples, dando a eles esperanças, vislumbres de um futuro que parece promissor e feliz, infelizmente o destino tinha outros planos e a vida os leva por caminhos que se entrelaçam, mas que parece jamais se cruzar, e de jovens sonhadores, passamos a conhecer adultos feridos.

Violetta é o tipo de protagonista que te cativa pela impulsividade, ambições e desejo de mais, ela alimenta seus sonhos, se nega a aceitar o que está acontecendo, mas que acaba te irritando no desenrolar da trama. Sua personalidade brilhante e encantadora, se transforma em alguém egoísta, vaidosa e até ingrata, tomando atitudes infantis e que mais decepcionam do que surpreendem. Com Mino minha relação também não foi muito diferente, no início ele se mostra um jovem carismático, gentil, trabalhador e muito certo do que quer, mas o excesso de drama sobre ele, acabou perdendo a mão e deixando de fazer sentido. E foi então que quando me dei conta, estava mais interessada nos personagens secundários do que nos protagonistas. Ana e Laura roubam a cena, Laura é uma amiga leal, esforçada e que merecia mais destaque, e Ana… bom de longe minha personagem preferida nesta história, é uma jovem forte, batalhadora e que cuida dos seus, com um coração generoso, merecia muito mais do que a autora optou por lhe dar.

No telhado, os dois falavam uma língua secreta feita de música. Porém estavam mais velhos agora, tão diferentes dos órfãos que haviam sido um dia.

Eu gostei da leitura, é um romance de época bem diferente dos convencionais, que foge tanto no cenário, quanto na escolha de personagens para se criar uma narrativa, então estamos diante de um enredo “original”, que explora a Veneza do século XVIII, que tem como cenário o tradicional carnevale, e órfãos como protagonistas. Eu amei o início da trama e todas as expectativas e possibilidade que ela oferecia, mas me decepcionei muito com o desenvolvimento do enredo. A história é boa, é um livro interessante, que te proporciona uma deliciosa viagem por Veneza, mas que me deixou com aquele gostinho agridoce de que poderia ter entregue mais, que poderia ter sido melhor aproveitada, desenvolvida, explorado alguns personagens e histórias mais profundamente. E isso me deixou com a sensação de que faltou algo. O romance ficou em segundo plano, explorando muito mais a jornada individual dos personagens, e seus muitos desencontros, do que o amor que aparentemente ambos sentiam. Outro ponto que ainda me incomodou foram as passagens abruptas de tempo, alguns excessos e repetições de descrições e o plot que ficou óbvio e fácil demais, tirando todo o brilho do enredo, e que pra mim fez com o que o final fosse apenas OK.

Acredito que Lauren Kate tenha mergulhado nos romances adultos muito timidamente e por esse motivo a trama acabou ficando no meio do caminho. Não me interpretem mal, a história é boa, tem um enredo interessante, mas que peca no desenvolvimento. Mas como sempre digo, a única maneira de saber se você gosta ou não de um livro, é lendo, portanto, leia e tire suas próprias conclusões.

  • The Orphan's Song
  • Autor: Lauren Kate
  • Tradução: Carolina Simmer
  • Ano: 2019
  • Editora: Record
  • Páginas: 322
  • Amazon

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