Flora é uma jovem de dezessete anos, mas até esse pequeno fato sobre si mesma ela precisa anotar, ou seja, precisa de ajuda para se lembrar, pois sua mente está presa aos dez ano, período em que foi diagnosticada com um tumor na cabeça que após a cirurgia passou a não conseguir reter memórias, ela desenvolveu amnésia anterógrada. E apesar desta condição, ela tenta levar uma vida o mais normal possível, só que para conseguir isso ela desenvolveu o hábito de fazer anotações pontuais em seus braços, mãos, cadernos e post its, que ela mantém espalhados por vários lugares. Por esse motivo, é comum que muitas vezes ela se sinta perdida, confusa, sem saber de fato onde está, o que está fazendo, onde fica sua casa, qual sua idade, o nome de sua melhor amiga.

Mas algo extraordinário acontece em um determinado dia, um fato inacreditável que se torna uma memória, a única memória que Flora consegue reter e reviver diariamente, e isso acontece de forma natural e não porque ela anotou. Ela beijou um garoto, e não foi qualquer um, e sim Drake, o namorado da sua melhor amiga que está de mudança para o ártico. O porquê desta lembrança ser a única a permanecer é um mistério que Flora está determinada a desvendar, nem que para isso ela precise desafiar todos e a si própria, e ir atrás do mesmo.


Eu preciso falar desde já que amei e fui surpreendida por A Única Memória de Flora Banks. Eu fiquei presa a história desde as primeiras páginas, com todas as peças soltas, com todos os mistérios que rondam a vida da Flora, que vai muito além do que apenas ela reter uma única lembrança, o livro tem muito mais a ser desvendado. E justamente por estarmos presos a perspectiva da Flora, ao que ela está vivendo e entregando ao leitor, ficamos confusos junto com ela, com a sensação de estarmos perdidos em meio a trama, revivendo o mesmo acontecimento, e eu acredito que isso foi totalmente proposital pela autora, para que nos sentíssemos angustiados, por vezes enfurecidos, desesperados por respostas, por solucionar o mistério que ronda a vida da protagonista e assim criar uma ligação poderosa com ela.

Pego no sono imaginando como é ser normal. Imagino minha cabeça cheia de imagens nítidas de todas as coisas que realmente aconteceram, arquivadas para eu poder voltar a elas e vê-las sempre que quiser. Não consigo imaginar esse luxo e adormeço chorando por tudo que me falta. Espero acordar e ainda conseguir lembrar.

Flora surpreende o leitor, à medida que surpreende a si mesma, principalmente por sua coragem, determinação em busca de respostas, vontade de viver e ser feliz. E embarcar com ela nessa trajetória de autoconhecimento é muito especial. Até porque, nem Flora, nem os leitores estão preparados para tudo que irão encontrar; verdades, reviravoltas, segredos sobre si e sua família, fatos e acontecimentos que irão mudar completamente a vida dela para sempre.

Eu amei ler A Única Memória de Flora Banks, me envolvi, fui surpreendida e terminei a leitura com lágrimas nos olhos. Flora é o tipo de protagonista que desperta mil emoções no leitor, primeiro porque temos uma jovem vulnerável, por vezes frágil, que está presa em suas memórias de infância e tentando de muitas formas ter uma vida normal, as anotações passam a ser uma parte importante dela, oferece certa independia, permite que ela se sinta mais segura, até mais próxima da idade que ela está de verdade, a medicação que ela toma também oferece “ajuda”, só que isso não apaga o fato de suas memórias serem de quando ela tinha dez anos, portanto temos atitudes imaturas, impulsivas, infantis, mas que se alinham perfeitamente ao que está sendo entregue, portanto justificáveis e compreensíveis.

Mas voltando a Flora, que como mencionei apresentava uma fragilidade e vulnerabilidade inicial, é incrível vê-la desabrochar. É lindo, acompanhar sua jornada, a maneira como ela se veste de coragem, de força, de motivação e parte em busca de respostas, de encontrar a chavinha que virou sua mente, aquilo que reteve uma memória nova e única, que se transforma em algo tão precioso.

Um outro ponto que ainda quero salientar são os personagens secundários que acabam sendo pouco explorados, mas lembrando mais uma vez, estamos condicionados ao que a Flora entrega, e suas memórias e percepções são limitadas, o que não chega a incomodar, mas deixa um gostinho de que poderíamos ter tido um pouco mais deles.

Viver o momento sempre que posso deve ser uma das minhas regras da vida. Não é preciso memória para isso.

Para quem ama histórias que emocionam, que cativam, que trazem reflexões, que surpreendem com um final que é como um soco no estomago, leia A Única Memória de Flora Banks, leia de coração aberto, pronto para receber tudo que a história tem a entregar, você não irá se arrepender. É lindo, e por vezes doloroso, mas de fato muito especial. Emily Barr possui uma narrativa envolvente, delicada e sensível. Ela aborda temas delicados de maneira muito respeitosa e consciente. Amei sua construção narrativa, a forma como ela desenvolveu os personagens e aos pouquinhos foi entregando as peças que fecharam com maestria o quebra-cabeça da vida da Flora.

Fica aqui essa dica, vou torcer para que desperte a sua curiosidade e que você leia e assim como eu, se apaixone. Até a próxima! Bye.

  • The one memory of Flora Banks
  • Autor: Emily Barr
  • Tradução: Débora Isidoro
  • Ano: 2020
  • Editora: Verus
  • Páginas: 279
  • Amazon

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