Lucas, um jovem brasileiro foi adotado por um casal de classe alta, vive em Portugal e tem uma vida bem confortável. Com apenas 19 anos, ele se sente abandonado, pois acha que seus pais adotivos não se importam muito com ele; mas as coisas mudaram agora que está em depressão e já tentou se matar 5 vezes. Sua vida parece não ter sentido, até o dia em que ele descobre um vídeo de Rafael tocando violão e cantando no YouTube.

A curiosidade de conhecer esse jovem – que é a cara dele – faz Lucas viajar até o interior do Rio de Janeiro para entender melhor a ligação genética que ambos tem, afinal, eles são irmãos gêmeos. A convivência com a família e amigos de Rafael, muda seu ponto de vista sobre a vida, a si mesmo e a família que deixou em Portugal.
A narrativa de Nunca Vi a Chuva é em formato de diário por recomendação de sua psicóloga. O autor decidiu unir o gênero textual de diário junto com a prosa, então vamos encontrar diálogos e descrições dentro das páginas confessionais. É fácil se conectar ao Lucas, sentir raiva, felicidade, ver suas imperfeições, defeitos e acompanhar sua trajetória em busca de autoconhecimento.
“[…] ela conseguiu me convencer de que, sim, eu tenho grande dificuldade de me abrir com as pessoas. E comigo mesmo.“
É uma história bem depressiva no começo, já que Lucas tem tendências suicidas e questões emocionais. E apesar dele ter me irritado um pouquinho no começo por ser um garoto privilegiado e mimado, também acreditei que ele não vê a importância do seu lugar no mundo junto com as pessoas que o rodeiam. Mas conhecer Rafael, atravessar o mundo, abrir os horizontes mudam sua cabeça, renovam suas esperanças.
Stefano Volp foi muito eficaz ao desenvolver afetos que podem curar cicatrizes e o poder de entender melhor a si mesmo através da união familiar, que tem bastante aqui. Ao chegar no Rio, Lucas conhece toda a família e amigos que rodeiam os Soares, e como eles se importam e amam Rafael. Sair da sua zona de conforto de garoto mimado, que tem cartões sem limite e uma empregada que dá tudo em mãos, o ajuda a ver valor nas pessoas e também na sua própria família.

Queria ter dado uma nota maior, porém achei o Lucas muito capacitista ao lidar com o Rafael. Talvez seja assim mesmo que pensemos e nunca expressamos em voz alta ao perceber como uma pessoa deficiente lida no dia a dia, e foi uma proposta interessante Volp ter feito o personagem assim, dando voz ao preconceito e nos ajudando a entender que pessoas PCD estão apenas tentando viver suas vidas normalmente e que não somos salvadores de ninguém. Outro ponto que achei negativo foi a forma caricata ao revelar o motivo dos gêmeos serem dados para a adoção.
“Nunca esquecerei dela. E nunca esquecerei de quem eu não quero ser.“
O que me surpreendeu bastante foi a sensação de estar lendo uma novela das nove na globoplay. A descoberta vibrante no começo, a decisão de mudar a vida a partir daí, o inesperado sendo uma mudança incrível, as ligações familiares, as tensões, as burradas ao longo do caminho e uma reviravolta que deixa a gente de boca aberta.
Não quero falar muito porque é um livro curto e as páginas passam voando. Então se você está procurando um livro nacional que fala sobre negritude, desigualdade social e algumas das mazelas do nosso país com uma narrativa sobre a possibilidade transformação na vida de uma pessoa, indico muito “Nunca Vi a Chuva“.

- Nunca vi a chuva
- Autor: Stefano Volp
- Tradução: -
- Ano: 2023
- Editora: Galera Record
- Páginas: 224
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