Calla parece ser uma adolescente normal, se desconsideramos que ela mora em uma funerária, que o irmão sofre de uma forma grave de esquizofrenia e que a mãe morreu recentemente e ela é culpada por isso, ou ao menos se sente assim. Na verdade, ela não é nada normal, e conviver diariamente com a loucura está cada vez mais difícil. O pai não está lidando bem com o luto, o irmão está cada vez mais distante e para completar, um lindo desconhecido aparece constantemente em seus sonhos.
Dare DuBray é realmente lindo, e agora mora não apenas em sua mente, mas também divide o mesmo espaço físico que ela. Um vizinho sensual e misterioso é a única coisa capaz de mantê-la lúcida quando tudo parece estar desmoronando. Acontece que essa não parece ser a hora certa, nem o local certo, e ela não tem ideia se conseguirá lidar com toda a tensão sexual que surge sempre que eles estão próximos um do outro. Mas ela precisa salvar o irmão e salvar a si mesma no processo, e um segredo sombrio e assustador está sempre à espreita, esperando a hora certa para destruir tudo o que ela tenta desesperadamente construir.

Pessoas mortas não parecem adormecidas, como todo mundo gosta de dizer. Elas parecem mortas, porque estão mortas. Coitadinhas. Eu me recuso a ficar boquiaberta por elas. A morte decepa a dignidade das pessoas, mas eu não preciso ser aquela que segura a faca.

Nocte promete uma leitura misteriosa e sexy, daquelas que nos envolvem do início ao fim. A capa realmente traz essa impressão e uma sinopse nada reveladora parece ser o ápice para um livro que tinha tudo para ser único e viciante. O que eu realmente encontrei nessa obra, foi um enredo confuso e arrastado, que tinha muito a oferecer, mas que falhou quase miseravelmente. O livro faz parte de uma série, e eu acho que foi exatamente nesse ponto que a autora pecou. Tentar arrastar uma boa história, por livros e livros, faz com que a trama perca a intensidade necessária para conquistar e irrita o leitor pelo modismo das continuações rasas.

Não me entenda mal, a escrita de Courtney Cole ainda tem muitos aspectos positivos, mas eu esperava que clímax da história chegasse a cada novo capítulo, mas isso nunca aconteceu. Ela deixou toda a emoção da trama para o desfecho, e usou isso como cliffhanger para a continuação. A sacada seria inteligente, se não fosse um desrespeito com quem está acompanhando Calla em seus muitos mistérios. E vou começar exatamente por essa situação.
Calla está lidando com coisas demais, e o irmão, que é sua maior preocupação, está cada vez mais distante e cheio de segredos que a incomodam. Ela precisa fazer algo já que a mãe está morta e o pai completamente ausente em sua própria dor. Ela possui um meio para descobrir enfim qual o problema real que acomete o irmão e está com isso em mãos, mas posterga até o limite essa descoberta. Sério mesmo que se a situação é de vida ou morte como a escrita sugere, você fica tentando decidir se segue em frente ou não? Puxa vida, não venha brincar com nossa inteligência.
No meio do caminho ela lida com culpa pela morte da mãe e a paixão crescente que sente pelo desconhecido vizinho Dare DuBray. Parecia que eu estava lendo Crepúsculo e acompanhando Bella Swan em seu interminável monólogo sobre a beleza extraordinária e surreal de Edward. Eu definitivamente não tenho mais paciência pra esse tipo de narrativa adolescente. Fiquei incomodada por todos aqueles feromônios que nada condiziam com a realidade da protagonista. O cara respira e ela fica de calcinha molhada logo após ter chorado lembrando-se da morte da mãe… É irreal, é desconexo, é aleatório.
Já o personagem masculino é realmente tão sexy quanto se espera de um bad boy, exceto que ele não é nada disso. Ele usa roupas pretas, pilota uma moto incrível, tem um corpo sarado, tem um sotaque inglês envolvente e é isso. É exatamente isso que você sabe dele. Não houve um aprofundamento. Calla se apaixona por ele aceitar a vida incomum dela? Por ele ser bonito? Por ele estar próximo quando ela se sente só? Fica aí o questionamento. Envolvimento raso e rápido.

“Dare… Desafio. Nunca vi um nome tão adequado. Tão francês, tão sofisticado, embora o sotaque seja britânico. Ele é um enigma. Um enigma cujos olhos cintilam como se estivessem constantemente dizendo “me desafie”. Engulo em seco.”

Não há personagens secundários. São 293 páginas compartilhadas com apenas 4 indivíduos, e eles nem nos são devidamente apresentados. O que aconteceu nos 44 capítulos? Não sei dizer muito bem. Promessas, e mais promessas e nada realmente acontece. Talvez Finn, o irmão de Calla, seja a única personalidade realmente interessante no enredo. Seus capítulos são curtos, cheios de loucura, assustadores. Eu queria ter visto mais dele, mais de sua mente perturbada, mais de suas motivações, mas isso não foi bem aproveitado. A relação dele com a irmã é tão doentia quanto sua condição. E o que era aceitável no início se torna problemático quando Dare entra em cena. Os sentimentos são confusos e obsessivos, algo que um irmão não deveria sentir e Calla não parece saber como reagir nesse processo.
Por fim falaremos do desfecho que é o único ponto alto da trama e o que foi melhor desenvolvido. Deu pra perceber a autora sabia como seria o fim desde o início e sua afobação em chegar nesse ponto pode ter sido o que prejudicou a fluidez da narrativa. Os mistérios são enfim revelados, outros tantos são acrescentados o que direciona o leitor para as continuações e você pode ficar um pouco chocado. Não vou mentir, eu fiquei sem palavras. Foi coerente, fez todo o sentido e trouxe o tão esperado golpe de misericórdia.
Mas a verdade é que nesse caso um final espetacular não consegue sustentar uma trama tão rasa e mal aproveitada. Eu queria mesmo dar uma boa avaliação pra esse livro, já que a ideia é original e parece ter tudo para prender o leitor, mas precisamos ser sinceros, faltou um pouco de maturidade no desenvolvimento e eu ainda preciso decidir se irei acompanhar a continuação dessa história. Eu gostaria muito que, apesar da minha opinião tão negativa, você ainda pudesse conhecer Nocte, eu amaria poder discutir essa leitura com mais pessoas. Espero vocês nos comentários.

  • Nocte
  • Autor: Courtney Cole
  • Tradução: Mauricio Tamboni
  • Ano: 2018
  • Editora: Verus
  • Páginas: 294
  • Amazon

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