Trinta e sete anos após o lançamento da primeira adaptação de Duna dirigida por David Lynch, o clássico de ficção científica do norte-americano Frank Herbert ganha seu reboot pelas mãos do hábil diretor franco-canadense Denis Villeneuve (Blade Runner 2049, A Chegada, Sicario: Terra de Ninguém). Desta vez, sem a pressa de narrar toda a história de pronto, como a adaptação de 1984 o fez parcamente, o primeiro livro de Herbert foi dividido em duas partes onde a primeira delas estreou ano passado e agora concorre a, dentre outras categorias do Oscar, Melhor Filme do Ano – e é aqui que mora minha aposta.

Uma superprodução hollywoodiana com o pacote completo, inclusive com as pequenas alterações em relação ao livro de Herbert, que poderia me segurar à esta cadeira por horas a fio na tentativa de dissecá-la minuciosamente. Contudo, procurarei ser breve.

Com um elenco de peso – Timothée Chalamet (Paul Atreides), Rebecca Ferguson (Jessica Atreides), Oscar Isaac (Leto Atreides), Zendaya (Chani), Jason Momoa (Duncan Idaho), Stellan Skarsgard (Vladimir Harkonnen), Dave Bautista (Glossu Rabban), Javier Bardem (Stilgar), Josh Brolin (Gurney Halleck), Charlotte Rampling (Reverenda Mohiam), David Dastmalchian (Piter De Vries) e Stephen Henderson (Thufir Hawat) –, fotografia espetacular de Greig Fraser e a trilha sonora épica composta pelo genial Hans Zimmer, Duna é uma ópera espacial que deve ser aplaudida de pé.

Funcionando como uma espécie de base, o filme leva o espectador por um passeio ao deserto onde nos é mostrado mais acerca dos personagens que das tramoias políticas que levam a guerra entre as casas Atreides e Harkonnen. Poucos filmes (e séries), especialmente os que tem fundamento em livros, funcionam tão bem quanto este. Claro que os aspectos visuais, sonoros, de efeitos especiais, atuações, figurinos, maquiagens e, obviamente, o roteiro são de extrema importância e aqui foram tratados de forma tão eficaz quanto primorosa, mas é pelo respeito e a abordagem que o diretor e sua equipe mostraram pela obra mãe que realmente fisgam a atenção do público. Não à toa esta adaptação de Duna é considerada O Senhor dos Anéis da década, e não é pouca coisa tal comparação!

O filme se passa em um futuro distante onde várias casas são governadas pelo todo poderoso Imperador que delega ao chefe de uma das famílias mais importantes, Leto Atreides (Oscar Isaac) a administração do planeta mais desértico do universo e o único lugar onde a especiaria utilizada para as viagens interplanetárias se encontra: Arrakis, também conhecido por Duna. Repleto de intrigas políticas e um forte misticismo envolvendo as Bene Gesserit – um tipo de ordem de mulheres bruxas que parece comandar as fileiras políticas da galáxia – as 2 horas e 35 minutos do filme tem ritmo próprio, com a vagarosidade necessária para apresentar as muitas personagens e suas peculiaridades, especialmente a “jornada do herói” do jovem Paul Atreides (Chalamet) que se vê conforme o espectador: descobrindo as coisas com o andar da carruagem; em sua busca por sobrevivência pelo deserto e pelos nativos do planeta, os Fremen.

De forma sutil, e ao mesmo tempo escancaradamente, o filme faz o espectador mergulhar nas muitas facetas da história que vai se desenrolando. O que parecia ser algo simples se desenrola numa trama complexa que envolverá vilania, ecologia, ganância, guerra, uma certa forma de magia, romance, criaturas gigantescas que se comportam como guardiãs do deserto e militarismo num nível estupendo há muito tempo não visto nas telas do cinema. Não me surpreenderia se uma lágrima ou duas rolasse pelo seu rosto após ter esse contato com a obra – tanto literária quanto cinematográfica.

Me surpreendi positivamente com as atuações onde todos residem perfeitamente bem em seus papéis, como se tivessem nascido para interpretá-los, e no quão entrosado o elenco parece ser. E por esse e outros motivos, não consigo apontar defeitos para Duna. Talvez o filme seja lento, longo e talvez seja envolto em mistério e intrigas demais, contudo são esses elementos que tornam o jogo interessante e pronto para ser jogado.

Uma influência para incontáveis autores e um marco na literatura de ficção científica, Frank Herbert sem dúvida aprovaria esta primeira parte de Duna e logo torceria para que seu colega visionário Denis Villeneuve levasse para casa a estatueta mais importante da noite deste dia 27 de março de 2022: o Melhor Filme do Ano.

Por fim, assistir essa adaptação fez reascender a chama da esperança de que há ainda no mundo diretores brilhantes que respeitam e honram as obras literárias a que se propõem a converter para as telonas (ou telinhas). Fica aí a dica para os demais.

Não terei medo. O medo mata a mente. O medo é a pequena morte que leva à aniquilação total. Enfrentarei meu medo. Permitirei que passe por cima e através de mim. E, quando tiver passando, voltarei o olho interior para ver seu rastro. Onde o medo não estiver mais, nada haverá. Somente eu restarei.

  • Dune
  • Lançamento: 2021
  • Com: Timothée Chalamet, Rebecca Ferguson, Oscar Isaac, Zendaya,
  • Gênero: Ficção Científica
  • Direção: Denis Villeneuve

rela
ciona
dos