Aqui conheceremos um casal apaixonado, em meados de 1911, Paris, época em que a Primeira Guerra Mundial estoura, separando Paul e Louise. O inferno das trincheiras é demais para Paul e assim ele se torna um desertor, considerado um crime contra seu país. Paul reencontra Louise, mas precisa se manter escondido para não voltar para a guerra. Seus dias se limitam a um quarto de hotel, mas logo se torna também uma prisão. A solução para seu problema parece óbvia. Paul precisa deixar de ser Paul e assim nasce Suzanne.

Degenerado é uma quadrinhos inspirado em eventos reais, mais precisamente baseado no livro La Garçonne et l’assassin, de Fabrice Virgili e Danièle Voldman. No livro e na HQ acompanharemos o curioso e trágico relacionamento de Paul e Louise, assim como o debate de temas como identidade de gênero, moralidade e traumas de guerra, entre outros temas verdadeiramente pertinentes também nos dias de hoje, como violência doméstica, machismo e a complexidade dos sentimentos românticos.

Chloé Cruchaudet relata esta história com um traço incrível e com muito equilíbrio, compartilhando o íntimo desses personagens, que por vezes vivenciaram fatos escandalosos para a época, tendo sua intimidade exposta durante a Paris dos anos 20. A solução de liberdade de Paul, durou aproximadamente 10 anos, e durante este período Suzanne Landgard experimentou as mais diversas aventuras (sexuais ou não), envolvendo também sua esposa no meio do caminho. Em meio as sombras do bosque de Bolonha, Paul se envolveu com grupo sexual secreto e para o casal, bastou os primeiros conflitos envolvendo ciúmes e possessividade para as coisas começarem a piorar entre eles.

A arte retrata todos estes sentimentos de uma forma única. Fazia tempo que não apreciava tanto o traço de uma história. Degenerado apresenta quadros criados aparentemente em carvão e pincel, nas cores preto e branco, com detalhes bastante específicos em vermelho. Estes para destacar a presença de Suzanne em cena. A quadrinista apresenta os movimentos dos personagens de uma forma bastante delicada e fluída também, se utilizando, às vezes, de mais de um quadro ou página, para interpretar a cena. Foram vários os diferenciais que fizeram pra mim toda a diferença na beleza da HQ.

Ao final desta edição podemos contar com arquivos oficiais do advogado de Louise, como trechos de diários do casal, cartas e anotações, utilizados no julgamento dela. Detalhe este que deixarei de fora para não estragar a experiência de leitura de ninguém. Estes arquivos nos ajudam contribuem para construção dos fatos ao longo da nossa leitura. Através deles podemos também ter uma pequena amostra da vida em paris nesta época, durante e pós guerra, a transformação dos papéis dos homens e mulheres, a maior visibilidade da homossexualidade e os esforços da justiça em prol das relações familiares tradicionais. Este é um retrato histórico importante, para entendermos os caminhos que esta história toma, que, segundo os pesquisadores Fabrice Virgili e Danièle Voldman, possui tantas lacunas incompletas.

Estas lacunas, na adaptação da HQ podem ser preenchidas, com sentimentos, diálogos e tantas outras manobras que só uma adaptação pode-se utilizar. Algo que em La Garçonne et l’assassin não era possível. Mas a verdade é que esta história nos fascina, a história de um casal que se amava e terminou de uma forma tão trágica. Fato ou ficção, está é a típica leitura que após ser finalizada, desejaremos estudar mais sobre estes personagens. Degenerado inicia de forma chocante, nos relembra sobre um recorte importantíssimo da nossa história e volta a nos fascinar com suas belas passagens perturbadoras. Com certeza se você quer conhecer esta história, a HQ é um bom começo!

  • Mauvais genre
  • Autor: Chloé Cruchaudet
  • Tradução: Renata Silveira
  • Ano: 2020
  • Editora: Nemo
  • Páginas: 192
  • Amazon

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