June Hayward e Athena Liu, colegas formadas em Yale, lançaram seus primeiros romances ao mesmo tempo. Enquanto Athena rapidamente alcançou o estrelato literário, acumulando prêmios e elogios, June ficou à sombra, com reconhecimento limitado e muito aquém do esperado.
A morte inesperada de Athena transforma tudo. Para June, a tragédia surge como a chance ideal de conquistar o reconhecimento que sempre lhe escapou. Movida pelo impulso, ela se apropria do manuscrito inédito da amiga: uma obra ousada que explora o papel dos trabalhadores chineses durante a Primeira Guerra Mundial.

A escrita de R. F. Kuang em Impostora permanece fabulosa. A autora, de um livro para outro, não perde a qualidade em suas narrativas. Nesta obra, em que temos June como personagem principal, Kuang não deixa Athena, sua personalidade e realizações, pessoais e profissionais, de fora. Saliento aqui que Athena era uma pessoa “cinza” (pelo menos foi assim que me pareceu), já que boa parte do que temos dela no livro é contado por June, que não a tinha em tão boa estima.
É notório o ciúme de June em relação à amiga, e em vários momentos podemos dizer que algumas de suas ações são até “justificáveis”. Afinal, quem nunca teve aquela colega, na época da escola, que tinha uma condição de vida melhor, que sempre aparecia com algo que você queria ter, ou aquele colega no trabalho, que sempre se deu bem com as oportunidades da vida? Essa era Athena.
Mas vemos ao longo da história que Athena não era 100% autoral em sua escrita, já que diversas coisas registradas eram falas ditas e experiências de outras pessoas. A vida alheia era a base para o que Athena escrevia, e muitas pessoas sabiam disso. Ao final do livro, temos algumas revelações que podem nos dar outro ponto de vista sobre certos fatos, uma perspectiva que vai se formando ao longo da leitura.
Agora posso entender o hype e os elogios feitos a Impostora. Não que eu duvidasse do potencial de Kuang, já que em A Guerra da Papoula ela simplesmente foi incrível, mas, ao finalizar a leitura, pude perceber o quão brilhante é esse livro, que começa com uma trama aparentemente simples, e escala para debates pertinentes, como apropriação cultural, identidade racial e as discussões que permeiam esses tópicos.
Para os fãs de livros que falam sobre livros, ou do mercado editorial como um todo, esta é uma leitura interessante e obrigatória. Afinal, discussões sobre diversidade e racismo são constantemente escanteadas em um mercado que se diz tão aberto e amplo, mas que, na realidade, continua reproduzindo erros já tão conhecidos.
*resenha revisada e editada por Joice Cardoso.

- Yellowface
- Autor: R.F. Kuang
- Tradução: Yonghui Qio
- Ano: 2024
- Editora: Intrínseca
- Páginas: 352
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