Nas guerras civis japonesas no período Edo, muitos samurais e combatentes se encontravam e guerreavam até a morte. Nesse contexto, uma prática virou “moda’, o samurai que estava prestes a ser executado, implorava pela vida antes de levar o último golpe. Então, ele prometia pagar ao final da guerra a seu possível executor, para sair vivo dessa batalha, um valor em dinheiro muito alto. Como forma de garantir, era feito um contato na hora, normalmente em um pedaço de tecido. Nele ia o nome, endereço e a assinatura (o carimbo da mão ensanguentada do solicitante do perdão. 

O mais impressionante é que depois da guerra, esse valor podia ser cobrado a qualquer momento, não existe validade no contrato. Então, muitas vezes, décadas depois que tiveram seus pedidos de clemência atendidos, esses samurais eram cobrados. Mas nem todos podiam ir atrás de suas dívidas, e assim entra nosso tomador de promissórias. Ele prestava seu serviço de samurai para ir até o devedor cobrar a dívida em nome de seu contratado. Caso o valor não fosse pago, seu papel era voltar com a cabeça do devedor. 

A leitura de mangás tem me propiciado muitos novos conhecimentos, e, por isso, eu tenho gostado muito de ler mangás de estilos diferentes. Então, com O Novo Preço da Desonra não podia ser diferente, acabei conhecendo outro gênero dentro dos mangás. Hiroshi Hirata é considerado o mestre do jidaigeki (gênero que aborda “dramas de época”, ambientados durante o período Edo da história japonesa, de 1603 a 1868). Além disso, nessa época, a importância dos samurais era gigantesca, a ponto deles serem considerados, até hoje, figuras míticas. 

O  mais curioso sobre essa minha leitura é o fato de eu não saber que existiam dois volumes. Quando eu peguei esse para ler, imaginei que ele era volume único, só descobri depois que era uma ‘continuação’. Hiroshi Hirata retoma aqui, as histórias de Kubidai Hanshiro, o tomador de promissórias, publicados pelo título de O Preço da Desonra, em 1971. Agora, nesse novo volume, publicado em 1977, o mangaká resolve se aventurar desenhando seu personagem por meio digital. Contudo, não se deixe enganar por essa informação, o segundo volume funciona muito bem sozinho e logo compreendemos o contexto da trama. 

Eu adorei esse mangá por vários motivos, mas o principal é o fato do mangaká brincar com a palavra honra/desonra. Aqui teremos quatro contos, e, para cada um deles, nosso protagonista vai atrás de um pagamento de promissória diferente. Assim, vamos ver como grandes guerreiros, de clãs importantes, fizeram contatos para não morrer. Muitas famílias, em negação, não conseguem acreditar que o maior guerreiro da família tenha tomado tal atitude, pois a maior honra de um samurai é morrer lutando. Esse ponto é bem explorado pelo mangaká que, junto dele, traz outras questões, como a vergonha.

Além disso, o autor não segue uma fórmula e traz diferentes contextos em cada conto. Inclusive em um deles temos um personagem que chega, acompanha e acaba tendo o papel principal na resolução da dívida. Eu gostei muito de como o mangaká coloca nas histórias o sentimento de família, orgulho e vergonha para cada uma das famílias, que têm reações diferentes, mas ao mesmo tempo semelhantes, quando confrontados com uma dívida tão vergonhosa para eles. Eu fiquei surpresa com todos os contos, e isso me ganhou.

Para fãs de cultura japonesa, samurais e mangás, é um deleite. Eu gostei tanto que já quero ler o primeiro mangá e já anotei o nome de outras obras do autor. Hiroshi Hirata possui, pela Pipoca e Nanquim, mais duas coleções; Satsuma Gishiden – Crônicas dos Leais Guerreiros de Satsuma, com três volumes, e Mais Forte Que a Espada, com dois volumes.

Avaliação: 5 de 5.

  • Kubidai Hikiukenin
  • Autor: Hiroshi Hirata
  • Tradução: Drik Sada
  • Ano: 2023
  • Editora: Pipoca e Nanquim
  • Páginas: 364
  • Amazon

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